Por uma revolta silenciosa

Eu estaria fingindo muita demência se não falasse hoje do assunto que toma conta de todos as rodinhas de amigos e mídias na última semana: a onde de protestos e o Brasil acordando pra vida. Na verdade nem me pronunciei muito sobre o assunto nas redes sociais e até agora não sei bem o vou escrever aqui, simplesmente porque confesso estar meio perdida no meio desse furacão.

Explico: é ÓBVIO que apoio todo o engajamento, os protestos, o fato do povo estar revoltado. Eu não pude participar de nada ativamente já que estou em recuperação do parto e com um recém nascido em casa, minha janela dá pros fundos do prédio e não adiantaria colocar um pano branco e meu wifi não pega nem no meu quarto, que dirá na rua. E afinal, não estou na rota de nenhuma passeata. Também não fico compartilhando feito louca tudo que aparece na minha timeline do Facebook. Já tem muita gente fazendo isso e eu só estaria poluindo ainda mais com informações.

Por fim acho esse “chamado” mais que necessário e pretendo fazer minha parte me politizando um pouco mais, estudando sobre o assunto, debatendo com os amigos, cobrando de quem votei nas eleições passadas e semeando a esperança de que as coisas podem e vão melhorar. Já vi coisas do tipo rodando o Facebook e acho que a essencial mudança também está em nós.

Vivemos em um país que frequentemente nos empurra para a marginalidade. A burocracia excessiva se faz necessária por causa do mau caratismo de alguns e como sempre, o todo acaba pagando o pato. Um exemplo: conheço tanta gente (e eu mesma já participei disso) que tem carteirinha de estudante falsa, simplesmente porque o acesso a cultura e lazer é extremamente caro. Virou uma bola de neve, os organizadores de shows já colocam os preços lá em cima porque sabem que a grande maioria vai comprar meia entrada.

No último ano não fiz uma carteirinha falsa. Percebi que enquanto eu me corromper por uma coisa tão banal quanto ingressos para shows, estarei fazendo parte E contribuindo para essa bola de neve de coisas erradas. Terei perdido a minha razão para cobrar preço acessíveis e um serviço justo. Vou atestar que continuo fazendo parte do jogo dos organizadores e aceitando sem reclamar tudo que me propõe.

Tudo isso que falei é apenas um paralelo, um exemplo de como pequenas e até então, corriqueiras atitudes que temos, contribuem para tudo chegar aonde chegou. Nós vamos votar “virados” da balada, loucos pra irmos pra casa dormir (eu não, porque sou mesária desde que voto... hahaha), nós sempre conhecemos alguém que pode facilitar qualquer coisa pra gente, nós achamos que temos mais direitos que quem está ao nosso lado no transporte público, nós achamos que podemos tratar de qualquer jeito quem nos serve em um restaurante, nós pegamos o lugar do outro no teatro porque a vista é melhor, nós não respeitamos quem tem dinheiro e uma história de sucesso, nós usamos “gay” como xingamento, nós falamos “tinha que ser mulher mesmo”, nós temos vergonha da cultura do Brasil, nós trocamos as notícias engessadas da Globo pelas informações nem sempre verídicas do Facebook e compartilhamos a notícia pelo título, sem nem ler seu conteúdo.

Enfim, eu poderia ficar falando e falando e falando...

O que proponho é que a mudança, a revolta, a desordem e a cabeça levantada contra o poder público continuem acontecendo ao mesmo tempo que uma revolta bem mais discreta, feita no silêncio dos nossos travesseiros, tome conta de cada célula do nosso ser.